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Sânscrito na Wikipédia

Quem for no artigo atual da Wikipédia sobre Sânscrito vai ler, na seção de pronúncia:

Com o advento da internet e o ressurgimento do sânscrito como língua falada, têm surgido cada vez mais sites que ensinam a pronúncia do sânscrito. O uso do som torna desnecessário recorrer a complicados sistemas de transliteração, que costumam gerar discussões bizantinas e prosopopéias trogloditas e poliglotas sobre prosódia e ortoépia, já que se pode aprender a pronunciar cada letra ouvindo-a.

(O trecho em negrito é quase poético, não?)

Esse é um parágrafo bastante infeliz, porque superestima muito o sânscrito como língua falada, ignora as diferenças de pronúncia que há na Índia, a impossibilidade de se usar o devanāgarī sempre, e confunde as noções de letra e som; mas o pior é o desrespeito pela tradição lingüística da Índia antiga, graças a quê restaram-nos os textos e os meios por que podem ser interpretados.

Mas quem terá escrito isso? Ao ler as versões anteriores do artigo, vi que o texto foi piorando com o tempo. No dia 3 de outubro de 2011 foi adicionado o que marquei em vermelho e entre colchetes:

Com o advento da internet e o ressurgimento do sânscrito como língua falada, têm surgido cada vez mais sites que ensinam a pronúncia do sânscrito. O uso do som torna desnecessário recorrer a complicados sistemas de transliteração, que costumam gerar discussões bizantinas e prosopopéias trogloditas e poliglotas sobre prosódia e ortoépia, já que se pode aprender a pronunciar cada letra ouvindo-a.

Alguém parece ter tido um mau 3 de outubro.

Mas e o resto? O resto é de 12 de abril de 2005. Essa vergonha de parágrafo tem sete anos*, e ninguém consertou ainda. Na Wikipédia em inglês nunca vi nada tão absurdo, mas que pese que eu não costumo ler os artigos controversos. Bem, sobre isso só me resta editar e torcer para que a edição permaneça.

Dessa safra de 2005 havia outro parágrafo, que felizmente foi expurgado:

A prática de transcrever os caractéres sânscritos para a escrita em alfabeto latino chamase transliteração. Contudo, não devemos utilizar a transliteração acadêmica para o português. Ela não é correta e ainda induz o leitor ao erro de pronúncia, como é o caso do "ç" usado para representar um som que não é dessa letra, por exemplo na palavra Shiva, cuja sonoridade chiada do primeiro fonema fica irreconhecível na grafia "Çiva", proposta pela transliteração portuguesa. Devemos utilizar a inglesa, que é mais lógica, é usada na Índia e serve perfeitamente para o português.

Todo livro decente que vi com transliteração de qualquer língua tem uma pequena introdução no começo, explicando a pronúncia. Como a fricativa palatal surda, a mesma do 'ch' em 'chá', pode ser melhor transcrita por 'sh', se esse dígrafo nem existe em português? A transliteração acadêmica é 'lossless', feita para que não se perca nada na transcrição, e não para que se possa ler pronunciar direito sem consultar mais nada. Há mais sons em sânscrito do que há em português: o nome disso seria milagre, não transcrição.


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